"Não se pode maternar sem sustentação. Não se pode maternar sem fusão emocional. Não se pode maternar sem buscar o próprio destino."
Laura Gutman, terapeuta argentina

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Mamar, desmamar, amar...sempre e até de olhos vidrados

Minha mãe conta que eu mamava com muita vontade, chegava a deixá-la dolorida. O bebê suga o alimento e água que se fazem leite e o calor e a energia materna que se fazem contato, com tanta gana quanto vontade de viver. Acho que fui uma bebê tormenta muito afoita por tomar-amar a vida que iniciava.
primeiríssima mamada
 do Mig orientada pela parteira Zeza
Depois foi minha vez de me tornar todo o alimento de Miguel, em colostro, leite, carinho. Está até registrado no vídeo do parto a minha emoção em sua primeira mamada, na primeira hora: “Que gostoso, puxou, tá  puxando!”.
Que coisa misteriosa este instinto, nossa parte mais divina! Que poderosa essa (in)compreensão, nossa parte mais humana. Demorei pra ver meu leite, embora Miguel mamasse bem e já tivéssemos aprendido uma boa pegada. Será que desceu mesmo? E Leandro, impaciente com minhas inseguranças: “Tu acha que ele está vivendo do quê? Prana?” Isso mesmo! Tanto prana que me levou a exaustão. Cansaço extremo no baby blues, dedicação integral (afinal, alimentá-lo era uma função pessoal e instransferível, dia e noite), sede, falta de libido, ausência de ciclo menstrual...Minha vida era tão somente a maternagem – hormonal e psíquica – escura, sonolenta, gostosamente quentinha, profundamente yin. Uma longa noite de amamentação. (Uma vez cheguei a sonhar que amamentava muitos bebês sucessivamente ou que havia vários Miguéis, enfim, loucuras de mãe).
Tive muita sorte e preparo, sem rachaduras, dor suportável (viva o chá de camomila e os banhos de sol).  O famoso empedramento só foi acontecer aos três meses, quando gripado ele não conseguia mamar e respirar ao mesmo tempo. Eu tirava o leite manualmente às gotas e lhe dava de colherinha com a homeopatia. Foi doloroso pra nós dois. Um dia, falando no telefone com minha mãe e espremendo o seio, começou a jorrar um chafariz de leite, algo nunca visto. Alívio...
A abundância maternal foi tão generosa comigo que tive o privilégio de dar de mamar a outro bebê que não era meu filho, mas de uma amiga e irmã espiritual que não pôde amamentar. Torcíamos tanto por esta criança – que amo de forma muito especial ainda hoje - que quando conseguíamos que ele pegasse meu seio meus olhos enchiam-se de lágrimas. Revivia a primeira mamada do Mig e talvez ancestralmente, as minhas vigorosas mamadas em minha mãe e de toda minha linhagem de humanos sobreviventes. Uma pulsação de vida em seu estado mais puro, que me toca profundamente.

uma das últimas mamadas com mais de 1 ano já, de "olhos vidrados"!

Há poucos dias, desmamei completamente Miguel, agora com 18 meses. Foi um processo lento,  suave e tranqüilo. Ele é uma criança saudável, feliz e amada, com muito apetite por comer, beber e viver. Me libertei de recomendações e teorias por vezes tão contraditórias, e senti literalmente em meu peito que era o momento pra darmos esse passo de maturidade e autonomia. Sem bico ou mamadeira, ele agora está pronto para outra fase de novas conquistas cognitivas. E pra outros “desmames” vida afora, sem precisar perder o precioso vínculo que criamos.